Foto: Bel Pedrosa/ Folha Imagem |
A caminho de uma entrevista com o jornalista Joel Silveira, no ano de 1999, um repórter resolveu por bem chegar duas horas mais cedo na casa desse velho combatente das letras. Só não esperava a grosseira receptividade:
- Vocês marcaram às 16h! – soltou o jornalista num resmungo quase mortífero.
Mas não se assuste. Quando se trata de Joel Silveira, o veneno das palavras já é velho conhecido. Eis um jornalista que sabia o que fazer com suas ironias, traduzi-las em texto ferino. No tempo da era getulista, os assuntos em relação à política e à vida particular dos Getúlios foram impostos como segredo de estado, nada a respeito deveria ser publicado nos veículos de comunicação da época. Oportunidade ideal para que Joel Silveira, o “víbora”, fosse à caça de outras pautas: a vida social e seus grã-finos que sobreviviam à custa da pompa.
Sergipano da cidade de Lagarto, o jovem Joel saiu com seus 26 anos de idade à procura de emprego na então capital federal, o Rio de Janeiro, no ano de 1937. Há tempos que seu pai já consumia o semanário Dom Casmurro e foi lá que o jornalista bateu primeiro, pedindo uma chance para também publicar seus escritos. Em 1938, a convite de Samuel Weyner, passou a integrar a equipe de Diretrizes, um dos veículos mais respeitados do período. Foi quando nasceu sua primeira reportagem de sucesso: “Eram assim os Grã-finos em São Paulo”, publicada em 1943 causou burburinho no meio da sociedade tradicional paulistana.
Joel Silveira morreu aos 88 anos no ano de 2007, vítima de câncer na próstata |
Vale a pena ler a produção. Joel literalmente se infiltrou na vida social da elite paulista e passou a freqüentar os lugares mais visitados do público-alvo de suas críticas. Um texto fino, é verdade, mas recheado de ironias, sutilezas, adjetivos matadores e metáforas pontiagudas, tudo para temperar sua reportagem. Em certa altura, explica francamente para o leitor o que era o conhecido “chá na Jaraguá”: “um ponto onde Fifi marcará encontro com Lelé para falar mal de Zuzu”. Os livros e a intenção dos organizadores em promover a cultura foram apenas coadjuvantes no fato que não escapou ao foco do jornalista.
Os intelectuais até tentaram, criaram a tal da “Bolsa do Livro”. Joel esclarece em poucas palavras: “Um pedaço de cartolina pregado numa parede da livraria. Um cavalheiro que tenha um livro raro para vender escreve o nome do livro e o preço na cartolina. Outro cavalheiro, que deseje adquirir uma raridade, faz a mesma coisa. Na tarde em que estive na Jaraguá, visitei a cartolina: o lado das preciosidades estava repleto.” A reportagem retratou muito da vida que os paulistanos abastados levavam no início do século XX. Joel foi tragado por aquele jornalismo ousado e literário e explorou a eficácia da narrativa irreverente. O veneno das palavras casou com a originalidade do jornalista, considerado até hoje como um dos pioneiros do fazer jornalístico-literário no Brasil. E viva a víbora!
Texto impecável, como sempre.
ResponderExcluirTem link para o texto dele?
Cuidado: rario?