sexta-feira, 20 de maio de 2011

José Hamilton Ribeiro, um repórter de grandes histórias


José Hamilton Ribeiro é uma daquelas figuras difíceis de esquecer. Jornalista desde 1955, o repórter de encanto singular demonstra também algo incomum em grandes profissionais da imprensa: a simplicidade. Foi ali, numa das livrarias da capital paulista que “Zé Hamilton”, como permite ser chamado,  discursou e encantou duas aspirantes à prática de um jornalismo mais profundo e cercado de humanidade.

Pela Universidade Federal de Santa Catarina, o “Zé” já é doutor no ofício jornalístico. Na internet, um documentário sobre o “príncipe dos repórteres” circula na rede e leva adiante informações e um pouco da imagem carismática do jornalista, que atualmente integra a equipe do programa Globo Rural, exibido pela Rede Globo de Televisão.

José Hamilton compõe o grupo de jornalistas que gostam de tocar fisicamente os cenários e os personagens de sua reportagem. Ingressou no curso de jornalismo da Faculdade Cásper Líbero na década de 50, e, ainda como estudante, teve seu primeiro contato com a imprensa ao cobrir férias de um jornalista na rádio Bandeirantes.

Após ler um anúncio na então Folha da Manhã – hoje Folha de S. Paulo -,  resolveu candidatar-se à vaga de jornalista. Marcou uma entrevista e recebeu um telegrama comunicando a aprovação para ocupar o posto no jornal. Tinha 20 anos de idade quando ingressou na redação e conta: “naquela época jornalista ganhava muito mal, os caras não eram sócios de clube, nem academia, jornalista era um tipo de um cartorário, trabalhador de cartório, mas ali tinham grandes poetas”.

Zé Hamilton segue seu próprio ritmo, vai falando de suas experiências e parece deixar o tempo correr a vontade quando a pauta da conversa é falar de jornalismo. Ele ensina que somente quando o repórter coloca-se a campo é que pode descrever com tamanha precisão e sensibilidade os fatos que envolvem o foco da reportagem. O jornalista aponta que a reportagem pode ter sido fator essencial na projeção da Folha como um grande jornal nacional para a época: “de um discreto jornal paulistano ao maior jornal do país”, segundo ele.

De qualquer forma, vale lembrar que hoje o espaço dedicado às grandes reportagens dentro dos jornais ainda é bastante limitado. O gênero parece libertar de tal maneira o jornalista das amarras do jornalismo convencional que não admite ser calculado em caracteres. Se a história narrada precisa ser detalhada a ponto de demonstrar nitidamente as experiências e impressões do repórter, talvez o bloco de texto dividido em três colunas não suporte o anseio de liberdade proposto pelo jornalismo literário.

Na revista Realidade, Zé Hamilton foi um dos grandes nomes a integrar a equipe criteriosamente selecionada pela editora Abril. As perguntas  quanto à passagem do repórter pelo veículo era certa na entrevista. Quando questionado sobre a reportagem que teria marcado sua vida, o jornalista cita logo a cobertura sobre a guerra do Vietnã.

O primeiro relato sobre a guerra (publicado na edição nº 26 de Realidade) refere-se ao acidente causado pela explosão de uma mina já nos últimos dias de sua passagem pelo cenário do combate. O repórter diz que a reportagem o marcou “também fisicamente”, ocasião em que perdeu a parte inferior de sua perna esquerda. Mas a matéria sobre a rotina no Vietnã seria contada na próxima edição, sob o título “Guerra é assim”. É nesta publicação que o jornalista descreve com riqueza de detalhes a situação do povo vietnamita frente ao combate norte americano.

Na foto, José Hamilton Ribeiro estampa a edição 26 de Realidade.
O jornalista perdeu a parte inferior da perna esquerda ao cobrir
 a guerra do Vietnã para a revista.

A respeito do sucesso de Realidade em seu tempo de publicação, José Hamilton revela que não acredita que hoje uma revista alcançaria tamanha expressividade como teve a publicação. Na visão do jornalista “o mundo é outro, a Realidade foi fruto de circunstâncias que não existem mais”. O jornalista reforça que uma revista bem feita no Brasil, de reportagem com qualidade de texto, como a Realidade , e ajustadas no tempo de hoje, não seria uma explosão de vendas mas com certeza teria leitores cativos. “A leitura é um prazer, e uma revista de leitura se faz com bons textos”, reforça Zé Hamilton.

Sobre a internet como meio de veiculação das grandes reportagens, o repórter considera o suporte como ferramenta, comparando-a com um tonel vazio onde as pessoas colocam o que bem entendem. “Ali vai ter jóias, vai ter anel de brilhantes, uma fotografia linda, um poema maravilhoso, pensamentos, mas vai ter tanta porcaria”.

Ao conceder uma entrevista certa vez, ouviu de uma repórter a dúvida que percorre a cuca de muitos admiradores de seu trabalho: “Como um repórter de tamanha categoria se limita a falar de boizinhos e vaquinhas na TV?”. Zé Hamilton é certo no falar: “O Globo Rural transmite ao público a alma do homem que vive no campo. E você vai dizer que a alma do homem urbano é maior que a daquele que vive no campo?”. Eis um pouco da essência desse jornalista de face iluminada e conversa recheada de riquezas.

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